Notícias

Em Itacoatiara, Comitê de Políticas Penais realiza 1.ª Audiência Pública Regionalizada a fim de coletar sugestões para Plano Estadual Pena Justa

Iniciativa fez parte das ações de construção do Plano Estadual “Pena Justa”, iniciativa vinculada ao Plano Nacional para Enfrentamento do Estado de Coisas Inconstitucional nas Prisões Brasileiras, e contou com a participação de cerca de 100 pessoas do próprio Município e oriundas de cidades do entorno 


O Comitê Estadual de Políticas Penais do Amazonas realizou na quinta-feira (05/06), no Município de Itacoatiara (distante 276 quilômetros da capital Manaus) a primeira Audiência Pública Regionalizada como parte das ações de construção do Plano Estadual “Pena Justa”, iniciativa vinculada ao Plano Nacional para Enfrentamento do Estado de Coisas Inconstitucional nas Prisões Brasileiras. A partir das contribuições feitas pelos participantes da audiência, o Comitê sistematizou 24 demandas, como propostas a serem analisadas na formulação do plano estadual.

O evento contou com a participação de cerca de 100 pessoas do próprio Município de Itacoatiara e oriundas de cidades do entorno como Urucurituba e Silves, e ocorreu no auditório da Câmara Municipal de Itacoatiara, sendo conduzido pela supervisora do Grupo de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e Socioeducativo do Amazonas (GMF/TJAM), desembargadora Luiza Cristina Nascimento da Costa Marques, que coordena o Comitê junto com o secretário de Administração Penitenciária do Amazonas (Seap/AM), coronel Paulo César Gomes de Oliveira Júnior – que também esteve presente.

Também participaram da audiência a coordenadora do GMF/TJAM, juíza Ana Paula de Medeiros Braga Bussulo; o juiz responsável pela 1.ª Vara de Execuções Penais de Itacoatiara, André Luiz Muquy; o presidente da Câmara dos Vereadores de Itacoatiara, Arialdo Guimarães; a assistente técnica estadual, no Amazonas, do “Programa Fazendo Justiça/CNJ”, Luanna Marley; a juíza da Vara do Trabalho de Itacoatiara, Adriana Lima de Queiroz; o procurador do Município, José Ricardo Xavier de Araújo (que representou o prefeito Mário Abrahim; a promotora da 1.a Promotoria de Justiça de Itacoatiara, Miriam Figueiredo da Silveira; a defensora pública Mariana Silva Paixão; o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil de Itacoatiara, Richardson Aranha; o bispo de Itacoatiara, dom Tadeu Canavarros; a presidente da Casa de Maria de Itacoatiara, Tânia Chantel; de demais autoridades; servidores da Secretaria de Estado de Direitos Humanos e Cidadania (Sejusc); órgãos estaduais e municipais e do Poder Judiciário do Amazonas e público em geral.

Antecedendo a audiência pública foi feito um minuto de silêncio pelo falecimento, no último domingo (1.º/02), na capital alagoana, do juiz auxiliar da Presidência do CNJ, Edinaldo César Santos Júnior, que teve forte atuação na área da Infância e Juventude e do combate à discriminação racial.

Ouvindo a população

A desembargadora Luiza Cristina explicou que o objetivo da audiência em Itacoatiara foi ouvir a população para que mostrassem as suas dificuldades em relação ao sistema carcerário.

“Essa audiência foi muito importante porque estamos unindo esforços do CNJ e do Tribunal de Justiça do Amazonas, Governo do Estado, através da Seap, junto à Câmara Municipal e à Prefeitura, que prontamente nos ouviu, abrindo espaço para essa audiência pública para que o público viesse aqui e mostrasse as suas dificuldades em relação ao sistema carcerário, as propostas, para todos nós juntos pensarmos e melhorarmos o Brasil”, afirmou a magistrada.

A desembargadora destacou que o Plano Pena Justa é uma realidade implantada pelo CNJ e que vem ao encontro de um anseio da população, principalmente aqueles que estão segregados e que precisam de tratamento humano. “É bom que se entenda isso: que nós temos que ter humanidade. Que essas pessoas segregadas consigam sair, ao final do cumprimento dessa pena, com uma mentalidade melhor, com mais instrução e, se possível, até com uma profissão, o que já temos conseguido isso no Amazonas. Acredito que juntos poderemos ter uma sociedade melhor. E agradeço a todas as pessoas que contribuíram para melhorar a nossa sociedade, que é isso que nós queremos”, disse a supervisora do GMF/TJAM.

A magistrada Ana Paula Braga salientou que o relatório elaborado pelo Comitê sobre a audiência será encaminhado para a Comarca de Itacoatiara e, em seguida, para a Câmara Municipal para que os vereadores locais tomem conhecimento do que foi debatido e possam participar, de forma mais ativa, da implementação dessas propostas e, algumas das quais dependem de forma direta do trabalho da casa legislativa.

“Conseguimos sistematizar tudo que foi apresentado aqui na audiência, não só pela mesa como do público presente, em 24 pontos diferentes que foram formalmente abordados e que ficarão como sugestão para que possamos analisar e colocar na formulação do nosso plano estadual. O próximo município em que iremos realizar a audiência pública será Tefé, em data a ser definida”, comentou a juíza Ana Paula Braga.

Para o juiz responsável pela 1.ª Vara de Execuções Penais de Itacoatiara, André Luiz Muquy, o Plano Pena Justa é um assunto de necessidade pública. “Essa audiência pública iniciou com uma determinação do Conselho Nacional de Justiça mas, afora, houvesse essa determinação ou não, na verdade ela é uma necessidade pública. A execução penal é um setor que fica muito relegado, até mesmo pelo Executivo, porque gera uma certa antipatia das pessoas pensarem coisas como ‘vão ajudar a pessoa que cometeu um crime, o criminoso’. Mas estamos aqui para conscientizar sobre isso porque, no momento em que estamos dando soluções e ressocializando aquela pessoa presa, indiretamente estamos protegendo a população. Evitando que aquele cidadão que cometeu determinado crime, volte a delinquir e se tornar uma ameaça à sociedade. A ideia é que ele se torne um cidadão normal, trabalhando e sendo produtivo”, afirmou o juiz.

O secretário da Seap frisou que o Pena Justa é um projeto amplo que terá reflexos em toda a sociedade. “O programa que abrange todas as unidades federativas do Brasil e o Amazonas foi escolhido para ter o pontapé inicial da aplicação do plano às pessoas privadas de liberdade no estado. Há de se entender que quem está privado de liberdade não deixou de fazer parte da nossa sociedade. A administração penitenciária não trabalha sozinha; ela precisa do apoio do Judiciário, do Ministério Público, da sociedade civil e das organizações de defensoria para promover a essas pessoas o convívio à sociedade. O Pena Justa é um projeto mais amplo que mexe com a sociedade, com o familiar, com a educação, saúde e promovendo aos entes privados de liberdade toda sua dignidade devida perante a legislação brasileira”, explicou o titular da Seap/AM.

A presidente do Instituto de Defesa das Mulheres e Meninas Casa de Maria de Itacoatiara, Tânia Chantel, afirmou que a audiência pública teve importância por enfatizar “a dignidade da pessoa que está com a liberdade retida e tendo em vista haver um processo de discriminação muito grande contra esse público”. Segundo ela, “discutir o Plano Pela Justa significa melhorar a capacidade da sociedade entender que aquela pessoa que está cumprindo pena, quando sair, possa ser reintegrada na sociedade e vista de uma forma igual”.

Demandas

Durante a audiência pública, autoridades e população presente elencaram as seguintes propostas: Garantia de vagas para mulheres privadas de liberdade; Reativação do Conselho da Comunidade. Será realizado diálogo em julho com os integrantes; Garantir transporte das pessoas que progrediram de regime ou que tiveram a Liberdade Provisória concedida; Garantir o transporte da sede para a Unidade Prisional para os familiares; Ampliação de oportunidades de trabalho para pessoas egressas, presas e em alternativas penais; Considerar a questão de gênero nas políticas penais; Desenvolver projetos para filhos de mulheres privadas de liberdade; Aprimorar os fluxos de atendimento e atenção à pessoas egressas do sistema prisional, com a implementação do Escritório Social; Realizar Feiras de Empregabilidade voltada para pessoas privadas de liberdade e egressas, a ser realizado pelo TRT em parceria com GMF/ SEAP, sociedade civil; Garantir Cotas no âmbito da educação superior para pessoas privadas de liberdade; Criar o Fundo Municipal de Políticas Penais em Itacoatiara, considerando a possibilidade de um Consórcio entre os Municípios que vise a implementação de ações de atenção as pessoas em alternativas e egressas do sistema nos municípios; Inclusão de uma Área ou Programa de Políticas Penais nos Planos Plurianuais dos municípios da região e em Itacoatiara; Retornar com acesso à ligações periódicas de familiares das pessoas privadas de liberdade; Possibilitar bebedouros nas alas/pavilhões garantindo o acesso à água gelada; Qualificar a atuação dos trabalhadores do sistema com capacitação permanente quanto ao tratamento juntos aos familiares; Verificar o body scan constante e treinar as equipes que operam; Recomendar que no Plano Pena Justa conste medidas e metas voltadas para familiares de pessoas privadas de liberdade e egressas; Garantir a celeridade dos processos e realizar Mutirões Processuais; Implementar projeto de áudio difusão (rádio) na Unidade Prisional para garantir campanhas, músicas e acesso a informações do que se passa extramuros; Garantir a abertura do cárcere para a sociedade; Transferir a assinatura dos pontos do semiaberto e aberto para um espaço no centro da cidade. De forma imediata, no Fórum, a curto prazo/médio prazo um Centro de Políticas Penais, com Escritório Social, central Integrada de Alternativas Penais, semiaberto e aberto; Criar Câmara Técnica Territorial de Itacoatiara e municípios no entorno; Aprimorar as estratégias de comunicação e participação popular no processo de elaboração e implementação do Pena Justa; Garantir a participação da sociedade civil que compõe o Comitê de Políticas Penais nas audiências públicas.

Outros municípios

Além da audiência em Itacoatiara, o Comitê deliberou pela realização de seis audiências regionais que serão realizadas nas comarcas de: Humaitá, Tabatinga, Atalaia do Norte, Tefé, Manaus e São Gabriel da Cachoeira. A audiência em Itacoatiara, primeira da série regionalizada, pretende abrir espaço para o diálogo sobre os desafios locais e propor contribuições concretas à política penal do estado, com foco em justiça social, direitos humanos e enfrentamento às desigualdades estruturais no sistema prisional.

Unidade prisional

Dentro das ações de construção do Plano Pena Justa em âmbito estadual, foi realizada na quarta-feira (04/06), na Unidade Prisional de Itacoatiara, uma consulta às pessoas privadas de liberdade para coleta de propostas visando à construção do Plano Pena Justa.

Trinta pessoas privadas de liberdade e dez trabalhadores da unidade foram ouvidas na escuta realizada pela equipe do GMF/TJAM, Seap e dois coletivos da sociedade civil – Coletivo de pesquisa e extensão Ilhargas – Cidades, Políticas e Violências (CNPq) da Universidade Federal do Amazonas (Ufam) e da Associação Coletivo Entre’Elas Defensoras de Direitos Humanos – que integram o Comitê Estadual de Políticas Penais do Amazonas.

Pelo GMF/TJAM a ação foi acompanhada pela desembargadora supervisora Luiza Cristina; pela juíza coordenadora Ana Paula Braga e pela secretária executiva Fernanda Priscilla Pereira Calegare, contando com o apoio da assistente Técnica estadual do Programa Fazendo Justiça (CNJ/PNUD), Luanna Marley.

O Plano Pena Justa

Lançado em fevereiro deste ano pelos Poderes Executivo e Judiciário, o “Pena Justa” é um plano elaborado conjuntamente pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), com apoio do Programa Fazendo Justiça (PNUD/CNJ). A iniciativa surge em resposta à decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), na ADPF 347, que reconheceu o Estado de Coisas Inconstitucional do sistema prisional brasileiro — caracterizado pela superlotação, hiperencarceramento, más condições carcerárias e violações sistemáticas de direitos fundamentais.

No Amazonas, o Comitê Estadual de Políticas Penais foi instituído por meio de uma Portaria Conjunta do Tribunal de Justiça e da Secretaria de Estado de Administração Penitenciária, sendo responsável por coordenar a elaboração do plano estadual, que deve ser entregue até o mês de agosto de 2025.

O processo de construção do plano inclui ampla articulação interinstitucional e forte participação social, com a realização de consultas e audiências públicas, conforme diretrizes do CNJ.

As audiências públicas são instrumentos essenciais para garantir a escuta de diversos atores envolvidos direta ou indiretamente com a política penal e prisional — incluindo pessoas privadas de liberdade, egressos, familiares, servidores, representantes do Sistema de Justiça, do Executivo, de organizações da sociedade civil, coletivos e movimentos sociais.

As noticias sobre as Audiências Públicas podem ser acompanhadas nos canais oficiais do Comitê de Políticas Penais do Amazonas, do Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas (TJAM) e da Secretaria de Segurança Pública.

+++++++

Texto: Paulo André Nunes

Fotos: Chico Batata

você pode gostar também